Ancoragem: a tática de Trump para impor tarifas às nações amigas
- Antonio Carlos Faustino

- 23 de jul.
- 3 min de leitura
Atualizado: 25 de jul.

O que é ancoragem na negociação?
A ancoragem é um viés cognitivo e técnica de persuasão usada para influenciar a tomada de decisão a partir de um ponto de referência inicial — o “âncora”. Esse ponto define as expectativas de preço, concessões e até limites nas tratativas comerciais. Trata-se de uma técnica comum em vendas, leilões e, cada vez mais, na diplomacia econômica.
Segundo Kahneman (2012), nosso cérebro tende a se apegar ao primeiro valor apresentado e ajusta suas decisões com base nele, mesmo que seja ilógico ou desproporcional. Em negociações internacionais, a ancoragem pode moldar acordos inteiros.
A tática de negociação de Trump: ancoragem agressiva
Durante sua presidência, Donald Trump utiliza a ancoragem como ferramenta central de sua política comercial. Ele parte de exigências extremamente duras — como tarifas altíssimas ou ameaças de sanções — mesmo quando lida com nações amigas dos Estados Unidos como Brasil, Canadá, México, Coreia do Sul, Japão e União Europeia.
O objetivo: fazer com que qualquer concessão menor pareça razoável e benéfica.
Casos emblemáticos:
NAFTA vs. USMCA – Ao ameaçar romper com o Acordo de Livre Comércio da América do Norte (NAFTA), Trump ancorou a negociação na incerteza e no prejuízo iminente. Isso forçou Canadá e México a aceitarem mudanças profundas no novo acordo: o USMCA (Acordo Estados Unidos-México-Canadá).
Tarifas sobre aço e alumínio (2018) – Países como o Brasil, aliados históricos, foram surpreendidos com tarifas de 25% sobre aço e 10% sobre alumínio. Ao lançar essas medidas unilaterais, Trump pressionou os parceiros a renegociar termos mais vantajosos para os EUA.
União Europeia e carros – Trump ameaçou impor tarifas de até 25% sobre automóveis europeus. A estratégia visava aumentar a margem de barganha e colocar os europeus na defensiva.
Por que essa técnica funciona?
A força da ancoragem está no controle da narrativa. Ao impor tarifas iniciais altas, Trump torna qualquer alternativa mais moderada uma "vitória" para os parceiros — mesmo que ainda sejam prejudiciais.
Essa técnica de negociação é especialmente eficaz quando:
Há desequilíbrio de poder entre os negociadores;
O parceiro comercial deseja manter relações amigáveis;
Existe pressão política ou econômica para fechar acordos rapidamente.
Além disso, Trump combina a ancoragem com retórica agressiva no Twitter, o que gera pressão pública e volatilidade nos mercados — um jogo de xadrez com peças midiáticas.
Críticas e consequências da ancoragem trumpista
Embora eficiente, essa técnica gera diversas críticas. Muitos analistas afirmam que Trump mina a confiança de aliados históricos, enfraquece o multilateralismo e dá margem para a China se apresentar como alternativa comercial mais estável.
“A política comercial de Trump foi pautada por coerção mais do que por cooperação.” (Bown & Irwin, 2020)
A imposição de tarifas prejudicou setores estratégicos da economia americana, como:
Agricultura (pela retaliação chinesa e europeia);
Indústrias dependentes de insumos importados;
Relações geopolíticas no longo prazo.
A técnica de negociação como arma diplomática
Mais do que uma manobra econômica, a ancoragem se tornou, nas mãos de Trump, uma arma diplomática. Ele demonstrou que até as nações amigas podem ser alvo de pressão se não seguirem os interesses comerciais dos EUA.
Isso estabeleceu um novo padrão nas negociações internacionais, incentivando outros líderes a adotarem posturas semelhantes, como vimos em Boris Johnson no Brexit ou em López Obrador frente aos EUA.
O que podemos aprender com isso?
Técnicas de negociação moldam o mundo real – O uso de ancoragem por líderes políticos mostra que essas táticas não são exclusivas do mundo corporativo.
Negociar com grandes potências exige preparo – Nações precisam investir em diplomacia estratégica e comunicação para resistir à pressão.
O viés cognitivo está sempre presente – Mesmo em negociações racionais, decisões são moldadas por percepção e contexto.
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Referências
BOWN, Chad P.; IRWIN, Douglas A. Trump’s Trade War: An Assessment. Peterson Institute for International Economics, 2020.
KAHNEMAN, Daniel. Rápido e Devagar: Duas Formas de Pensar. Rio de Janeiro: Objetiva, 2012.
WHEELER, Michael. A Arte da Negociação. São Paulo: HSM, 2016.




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